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Ainda na Caverna de Platão  - Espaço SODA arte

Sítio específico de Claudia Briza - curadoria Renato De Cara - 2023

 

“Os monumentos se tornam nada mais do que os portadores desse deserto.

Qual é a verdadeira forma da realidade? José Saramago já havia dito que, hoje, mais do que nunca, é o tempo de vivermos apavorados na Caverna de Platão. Passamos a enxergar por dispositivos variados as inúmeras imagens produzidas a todo instante. Aprisionados que estamos em novas cavernas, andamos mirando as sombras, à procura do foco que nunca vem e vamos nos perdendo no difuso contorno do real.

 

Dentro dos debates filosóficos que o tema nos oferece, como:
 

  • a natureza da realidade,

  • a busca pela verdade,

  • a relação entre o mundo sensível e o mundo das ideias,  a artista Claudia Briza ocupa o diminuto e charmoso espaço da Galeria Soda para destacar questões que dizem respeito a todos nós.

 

Preocupada com os desmatamentos, os apagamentos e outras atrocidades sociais, Briza vem mapeando regiões impactadas pelas atividades agrícolas usando a pelúcia como suporte pictórico, bem como também vem catalogando árvores mortas ou "matadas", encontradas pelas ruas de São Paulo. Em troncos fragmentados de madeira, a artista identifica ruas e quarteirões, imprimindo elementos gráficos em cor branca sobre a superfície áspera de suas cascas. Como um mapeamento brutalista, os objetos passam a ter outros significados, além de toscos tocos descartados ou corroídos pelo cupim.

 

Com aparatos técnicos para um shooting fotográfico, entre tripés, papel para fundo infinito e iluminação artificial, e, dentro de um repertório audiovisual, a artista ocupa o espaço, entendendo sua arquitetura como uma antiga garagem para automóveis e reconfigurando-a como um estúdio-caverna experimental. Estão dadas as atualizações para as ideias de Platão. A instalação escultórica  apresenta-se totêmica, monumental, imponente e pronta a ser retratada entre sombras de uma pequena natureza que insiste em estar ali.

 

Ainda temos no espaço três outras obras que dialogam com as questões de imagem, educação, pertencimento e adaptação. De um lado, o vídeo As Freiras da Minha Escola,  de 2015, que procura adaptar o formato de uma maçã aà uma caixa quadrada; uma ação que se divide em três atos: modelar a maçã por meio do corte afiado da faca; enquadrá-la em um cubo; e explodi-la com uma bomba caseira. A obra é sobre uma lembrança pessoal da artista durante sua formação escolar, desde o primário até o colegial - ou, como se diz, atualmente, do Ensino Fundamental I ao Ensino Médio. Memória que se relaciona diretamente com a doutrina católica e a igreja como estado de formação e de educação do indivíduo. Do outro lado, uma pintura sobre pelúcia, além da pequena instalação A Bolsa, de 2013, que traz um celular dentro de uma bolsa de mulher e um vídeo, em looping, com a artista questionando se sua aparência ainda é digna de ser mostrada enquanto protagonista na cena artística.

 

 

São trabalhos que se complementam nas proposições de Briza. As imagens, filtradas e difusas pelo digital ou presentes na matéria natural descartada desequilibram nosso estado emocional enquanto prisioneiros de uma época. A humanidade, pensando em avançar em direção à liberdade, perde a mão no descuido daquilo que lhe é mais caro:  – a vida real e o mundo das ideias.

 

Renato De Cara

Julho de 2023

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